terça-feira, 7 de agosto de 2012

ESSÊNCIA DE MULHER

A luta pela igualdade entre sexos, no se que se refere a direitos e deveres, foi grande, dura e sangrenta, marcada, inclusivamente, pela morte de mulheres valentes, que em tempos difíceis deram a sua vida na consecução de tal ideal. Basta recordar Olympe Marie de Gouges, guilhotinada, em 1791, por pretender que a Declaração de Direitos do «homem e do cidadão» se aplicasse também às mulheres. É graças a elas que hoje existe uma igualdade, pelo menos formal, reconhecida na nossa Carta Magna (Constituição), e podemos aceder praticamente a qualquer dos trabalhos realizados pelos homens. Mas, como sonhou Sigrid Undset, feminista do início do século XX, «o movimento feminista ocupou-se apenas com os ganhos, esquecendo-se dos prejuízos da libertação». É neste árduo processo para a igualdade que as mulheres sofremos um enorme dano colateral, ao deixarmos pelo caminho algo que nos é consubstancial: a essência feminina, a feminilidade. Assumimos de forma espontânea, e sem qualquer queixa, que os modos masculinos eram justos e oportunos; que devíamos imitá-los para conseguir a igualdade; seríamos nós, e não eles, que teríamos que mudar. E assim fizemos, escondendo os nossos sentimentos e afectividades por medo de sermos alcunhadas de débeis ou brandas, tentando ser frias e competitivas, adoptando um aspecto varonil; adulterámo-nos a nós próprias, sacrificámos a nossa alma feminina a troco de sermos recebidas no universo masculino e transformámo-nos em «hombretonas», imitando os comportamentos e maneiras de vestir dos homens. Recordemos como a grande jurista Concepción Arenal, em meados do século XIX, acedeu às aulas de Direito na Universidade Complutense de Madrid com roupas de homem, para satisfazer o seu desejo e interesse por esta licenciatura. Ou como Clara Campoamor, em 1931, para conseguir o direito de sufrágio feminino, renunciou expressamente à sua condição de mulher: «Senhores deputados: eu, antes de mulher, sou cidadã». As feministas igualitárias dos anos 70, com o pensamento de Simone de Beauvoir como bandeira, e os defensores do actual feminismo «de género» (segundo o qual a feminilidade e a masculinidade são construções sociais e, em consequência, os seres humanos são neutros ou sexualmente polimorfos), conseguiram que a sociedade assuma a ideia de que trabalhar em casa, ser boa esposa e mãe, é atentatório à dignidade da mulher, algo humilhante que a degrada, a escraviza, e a impede do desenvolvimento na sua plenitude. E que, para ser uma mulher moderna, é preciso previamente libertar-se do jugo da feminilidade, em especial, a da maternidade, entendida como signo da repressão e subordinação: a tirania da procriação. Esta ideologia, que entrou com enorme força nas mais altas instâncias políticas, provocou o desprestigio e mesmo o desprezo para com as mulheres que trabalhavam nas suas casas ou cuidavam dos seus filhos, que foram estigmatizadas, considerando-as pouco atractivas ou interessantes e nada produtivas para a sociedade. Ao contrário, aquelas outras mulheres que renunciam à maternidade ou ao cuidado personalizado dos seus filhos desde os seus primeiros dias de vida aparecem, perante a opinião pública como heroínas, autênticas mulheres modernas, que “sem perderem o tempo”, na atenção aos seus filhos, se entregam plenamente à sua profissão, pela qual sacrificam tudo, o que as liberta e converte em estereótipos da emancipação feminina. Esta estereotipificação inversa, favorecida pela atitude de algumas lideres políticas, distorce a imagem e prejudica a vida familiar da maioria das mulheres “comuns”, pois favorece a organização da vida profissional, ao não considerar as mulheres como mães e entendendo que os trabalhadores não têm obrigações familiares; dificultando, assim, a mudança de mentalidade sobre a importância real da maternidade, tanto para a mulher em si, como para a instituição familiar, base inquestionável da sociedade, sem a qual nunca poderão ser adoptadas medidas verdadeiramente conciliadoras para a vida familiar e laboral. Longe do mundo idealizado pelas imagens estereotipadas de mulheres hiper-libertadas que gozam exultantes da sua elevada vida profissional, que nos transmitem os meios de comunicação, na vida real encontramo-nos actualmente com demasiadas mulheres que, apesar do seu êxito profissional, se sentem profissionalmente frustradas e insatisfeitas, cansadas de imitar os modos de actuar masculinos, amarradas a uns modelos que não lhes pertencem e que não encaixam na sua essência mais profunda. Mulheres que se esforçaram por cumprir as suas funções «exactamente como um homem», e cuja natureza, rejeitada e reprimida, reage em forma de depressão, ansiedade e infelicidade. Estas mulheres estão a alimentar o nascimento de um novo feminismo. Mulheres que demonstraram, sobejamente, que são tão capazes, como qualquer homem, de chegar ao mais alto cargo profissional com brilhantismo e eficácia, e que não querem disfarçar-se de homens, assumir os moldes masculinos, nem emular as suas atitudes e condutas; mas ser elas mesmas. Flexibilidade; imaginação, intuição, cooperação, expressividade emocional; empatia, afectividade; consenso; pragmatismo; capacidade de improvisação e visão contextual; são algumas habilidades sociais inatas da mulher – quase todas acentuadas pela maternidade – que, segundo os estadistas, serão um valor em alta, praticamente, em todos os sectores da economia do século XXI. Com estas capacidades, as mulheres já lograram uma forte presença nas ocupações e profissões de serviços e dominarão muitos destes hábitos no futuro, facilitando soluções imaginativas, bem como novas e engenhosas formas de actuação, imagináveis em muitas ocasiões para o universo masculino. Chegou o momento de reivindicar que a actividade profissional se adapte à nossa condição feminina e não o invés. O novo feminismo defende um reconhecimento social para a labor da mulher, cuja forma de ver a vida e compreender a realidade é um valor inquestionável que deverá reflectir-se numas condições laborais favoráveis específicas e, portanto, não idênticas às dos homens; com uma especial atenção à maternidade que, longe de ser opressiva, é na maioria dos casos profundamente libertadora, enriquecedora e faz da mulher um ser mais pleno. É hora pois de recuperar o perdido, de reclamar a nossa peculiar, «memória histórica», exigindo a devolução da nossa integridade feminina. Algo sem o qual nenhuma mulher pode alcançar o equilíbrio pessoal e, portanto, a felicidade, pois como afirma Allison Jolly, primatóloga de Princeton, «só compreendendo a sua verdadeira essência, a mulher poderá assumir o controle da sua vida». A mulher só alcançará a sua plena realização existencial quando se comportar com autenticidade em relação à sua condição feminina. Porque para a mulher ser mulher é tudo. E o resto só é resto.

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